“A dúvida sobre a sua capacidade de alimentar as pessoas deixa de existir – ou deveria – quando observamos que, por exemplo, a agricultura orgânica parece ter sido criada sob medida para as propriedades familiares.”

Uma onça rugindo em uma floresta preservada prejudica o negócio dos agropecuaristas? Ameaça empregos? Encarece a alimentação? Desrespeita liberdades individuais? Atrasa o “progresso” da nação? Pois é, muita gente pensa desse jeito, como se a preservação da natureza fosse um freio para nossa economia. E vice-versa.

Essa visão maniqueísta não encontra eco nos verdadeiros produtores rurais e especialistas em meio ambiente. Mas está na cabeça de uma minoria barulhenta, invulnerável à lógica, cuja espalhafatosa falta de senso atrapalha o diálogo e atrasa as soluções.

Esse falso conflito, na verdade, é uma característica deste período de transição. Mas, felizmente, fora desse mundo paralelo, as forças da agricultura e da preservação se encaminham a um diálogo cada vez mais próximo e um futuro de bom senso e equilíbrio.

No entanto, é preciso manter-se atento e forte, pois existe um bombardeio constante de informações erradas, parciais, manipuladas ou francamente falsas. Essa aposta no caos e na intriga é bancada pela pequena fração da humanidade que ainda se agarra à ideia de que seus “lucros” dependem do conflito.

Entre as maiores falácias propagadas está aquela que mexe com os instintos mais básicos de sobrevivência: “Se optarmos pelos orgânicos vamos morrer de fome”. Será? Para aclarar esse preconceito, precisamos começar espalhando a definição correta da agricultura orgânica. Deixar claro que se trata de um método científico, filosófico, econômico e social que se materializa em variadas técnicas de produção de vegetais para alimentação e outros usos, todas elas bem definidas em lei federal. Não é seita, religião, partido político, escola ideológica ou algo do gênero.

Não por milagre, os orgânicos são a prova concreta de que é possível produzir – e muito, se necessário – utilizando técnicas de cultivo sustentáveis, que levam em conta a saúde da terra, das pessoas, da água, da flora e da fauna. E a sociedade como um todo precisa saber que o conceito orgânico não se resume à bem conhecida a ausência de venenos, mas engloba igualmente a valorização do trabalhador, o equilíbrio socioeconômico, a prática da justiça nas relações com vizinhos, empregados, fornecedores, distribuidores, comerciantes. É importante dizer, também, que os orgânicos são inovadores por natureza, já que este tipo de produção não se faz com receitas genéricas, mas levando em conta as características próprias de cada local.

A dúvida sobre a sua capacidade de alimentar as pessoas deixa de existir – ou deveria – quando observamos que, por exemplo, a agricultura orgânica parece ter sido criada sob medida para as propriedades familiares. Para se ter uma ideia das imensas possibilidades da conversão orgânica desses pequenos e médios agricultores, basta saber que eles, segundo a Embrapa, são mais de 5 milhões, ocupam 80,9 milhões de hectares ou 23% da área agropecuária total.

Mas isso não significa que a metodologia orgânica não possa ser aplicada a grandes propriedades. Não há nada que impeça esse salto do qualitativo para o quantitativo em termos práticos ou científicos. Há muitos exemplos de grandes produtores brasileiros que aderiram ao orgânico com grande sucesso. Inclusive internacional.

Se você, ao ler esse artigo, se sentiu tentado a empreender nessa área promissora, a primeira providência é entrar em contato direto com alguém que já produz, para conhecer a realidade do setor, na prática, ao vivo, com cores, cheiros e sabores. Também é importante visitar os órgãos ligados às secretarias de agricultura municipais e estaduais, pois muitas delas, além de fornecerem informações importantes, oferecem incentivos à produção orgânica, seja em apoio, crédito, compras diretas e outros.

O passo seguinte é se adequar à Lei, buscando um dos dois mecanismos de garantia da qualidade orgânica: certificação por auditoria ou certificação participativa. Lembrando que, se você pretende exportar seus produtos, a única certificação atualmente válida é a por auditoria, salvo para o Chile, com o qual o Brasil mantém um acordo diferenciado.

Outra coisa urgente: saiba ser buscado, profissionalize sua comunicação, informe e encante o consumidor, ocupe a atmosfera do mercado com belas e verdadeiras histórias, que são abundantes no fértil universo orgânico. É assim que o rugido da sua marca vai ecoar alto e forte, preparando a sua hora de beber água.

Cobi Cruz
Diretor Executivo da Organis – Associação de Promoção dos Orgânicos

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