“Graças às quatro pesquisas da Organis, hoje a grande cadeia de produtores, industriais, distribuidores e varejistas direta e indiretamente ligados ao setor dos orgânicos podem, finalmente, planejar com base em dados amplos, reais e atualizados de todas as regiões, deixando no passado as vagas ideias a respeito das motivações do consumidor. Não por acaso, os números, indicadores e tendências revelados pela Organis passaram a ser vistos como os oficiais do setor, pautando tanto a grande mídia geral como os órgãos especializados da imprensa, gerando interesse, curiosidade e debate.”

Às vezes parece que o Brasil é um país em guerra declarada com a realidade ou que, no mínimo, tem sérios problemas de relacionamento com a racionalidade. Muitos de nós, mexidos em seus brios patrióticos, poderão argumentar que isso é uma simplificação que reforça estereótipos negativos sobre o país.

Antes que me cancelem por falta de orgulho tropical, deixo claro que sou daqueles que teve a sorte, a graça e a honra de conviver com brasileiros a respeito dos quais se pode dizer muita coisa, menos que são avessos ao pensamento. Entretanto, mesmo reconhecendo que em meio às falhas coletivas temos imensas potencialidades humanas, vamos combinar que fica difícil achar algum argumento medianamente razoável para o fato do Brasil ter ficado quase 13 anos sem um censo nacional. Isso mesmo: um país de tamanhas dimensões, complexidades e desafios navegou de 29 de novembro de 2010 a 28 de junho de 2023, intervalo entre as pesquisas do IBGE, praticamente à deriva de dados, para enfrentar o mar bravio da cada vez mais feroz concorrência internacional praticamente à base de achômetros, chutômetros e outros instrumentos de precisão duvidosa.

Mas, podem ficar sossegados, não estou aqui para chorar sobre lágrimas derramadas. Pelo contrário, prefiro ocupar esse espaço enaltecendo as instituições brasileiras que, apesar da maré contrária, buscaram suprir o apagão oficial e traçar rotas com seus próprios esforços. Que seria da nossa economia, e da vida das pessoas que dela dependem, se não existisse essa verdadeira rede paralela de organizações da sociedade civil trabalhando na produção de algo tão essencial como os dados reais dos diversos setores do país? 

Vem daí a impressionante receptividade alcançada pela Pesquisa Nacional Organis, que em 2023 chega à sua quarta edição. A Organis é uma associação que, desde 2017, incluiu entre suas atribuições a realização de amplas prospecções bianuais sobre os hábitos do consumidor brasileiro em relação aos produtos orgânicos e o seu significado ambiental, social e mercadológico. Por iniciativa da Organis, vieram à luz, há seis anos, os primeiros dados efetivos sobre esse importante setor, que cresce aqui e no mundo, movimentando de forma inovadora a agricultura, a pecuária, a indústria, o comércio e a prestação de serviços. Chegamos à quarta pesquisa consecutiva, o que torna o conjunto ainda mais revelador, pela possibilidade de se estabelecer diferentes leituras a partir da comparação entre elas e, desta maneira, ter uma boa ideia de como o comportamento de consumo do brasileiro evoluiu neste período. Um grande feito que muito orgulha a Organis e seus associados, não apenas pelo que significa para o mercado específico, mas como parâmetro para todos os demais, ao revelar novas peças para esse grande quebra-cabeças que é a rica diversidade econômica, social, ambiental e humana, esse grande patrimônio do Brasil.

Graças às quatro pesquisas da Organis, hoje a grande cadeia de produtores, industriais, distribuidores e varejistas direta e indiretamente ligados ao setor dos orgânicos podem, finalmente, planejar com base em dados amplos, reais e atualizados de todas as regiões, deixando no passado as vagas ideias a respeito das motivações do consumidor. Não por acaso, os números, indicadores e tendências revelados pela Organis passaram a ser vistos como os oficiais do setor, pautando tanto a grande mídia geral como os órgãos especializados da imprensa, gerando interesse, curiosidade e debate. Prova disso são os inúmeros convites que a associação tem recebido para esmiuçar os resultados comparativos das quatro pesquisas, de forma mais detalhada, em eventos comerciais, acadêmicos e governamentais.

Peço licença para revelar alguns aspectos bem concretos da realidade. Por exemplo, a evolução do número de brasileiros que consumiram produtos orgânicos no último mês: 2017 – 15%, 2019 – 19%, 2021 – 31%, 2023 – 36%. Uma vitória clara dos esforços educativos e de comunicação do setor está no reconhecimento dos produtos pelo selo orgânico, que saltou de 3% em 2019 para 24% em 2021 e chega a 36% em 2023. Outra revelação é que, atualmente, 83% dos consumidores desejam que os produtos orgânicos estejam separados em uma sessão específica nos locais de venda. O que esses números significam, feitas as ponderações e cotejados com os demais? Bem, aí cabe a todos nós a tarefa coletiva de interpretar, decifrar e transformar essas e muitas outras informações em ações práticas. É para isso que a Pesquisa Nacional Organis 2023 está integralmente disponível para download no link.

Voltando à realidade: ela é simplesmente complexa, especialmente em um país de tantos contrastes, mas estou certo de que não adianta brigar com ela. Cabe a cada um de nós promover o conhecimento, o intercâmbio, a generosa divisão de saberes, para então podermos transformá-la. Com censo. E bom senso.

Cobi Cruz é designer, diretor executivo da Organis, membro do Conselho do Instituto Giro, entidade gestora de logística reversa de embalagens em geral e conselheiro do Consea.

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