“A variedade de vida na Terra é um fator incrivelmente importante na saúde e resiliência dos ecossistemas. Mas está em declínio em todo o mundo – populações de insetos e aves estão sendo dizimadas.”

Alegações de que agricultura orgânica é pior para o meio ambiente são muito simplistas, dizem Christel Cederberg e Hayo van der Werf

As pessoas estão mais interessadas do que nunca em fazer compras de alimentos produzidos de maneira ética e de proteção ao ambiente. Mas uma série de críticas negativas sobre o impacto ambiental dos produtos orgânicos pode deixar algumas pessoas coçando a cabeça.

O debate sobre isso é contencioso. Os críticos dizem que a agricultura orgânica é menos eficiente que a agricultura convencional e que por usar mais terra, leva a um maior desmatamento, o que causa maiores emissões de dióxido de carbono e perda de biodiversidade. Um artigo recente acompanhou essa lógica e descobriu que se a Inglaterra e o País de Gales se tornassem 100% orgânicos, tais emissões aumentariam em até 56%. A alegação ganhou manchetes.

Mas as descobertas desse e de outros estudos semelhantes são muito simplistas e ignoram aspectos positivos importantes na agricultura orgânica. Analisamos esses estudos e descobrimos que o método que eles costumam usar não fornece uma imagem completa.

Conhecida como Avaliação do Ciclo de Vida (ACV), essa abordagem simplesmente relaciona os impactos que o meio ambiente faz à quantidade de produto colhido numa determinada área de terra. Vista desta maneira, a agricultura intensiva costuma ser mais eficiente, pois seus rendimentos são mais altos. Mas isso não aborda adequadamente todos os aspectos ambientais.

Tais avaliações falham em explicar completamente o papel da degradação da terra, declínio da biodiversidade e impactos de pesticidas da agricultura intensiva.

Considere a biodiversidade, por exemplo. A variedade de vida na Terra é um fator incrivelmente importante na saúde e resiliência dos ecossistemas. Mas está em declínio em todo o mundo – populações de insetos e aves estão sendo dizimadas, algo que tem sido repetidamente vinculado às práticas prejudiciais da agricultura intensiva. As terras administradas organicamente, no entanto, tem demonstrado apoiar níveis de biodiversidade cerca de 30% mais altos que os campos de cultivo convencional.

Pode-se argumentar que a terra economizada pela agricultura convencional poderia ser reservada para biodiversidade e absorção de CO2. Mas a relação entre intensificação agrícola e redução de desmatamento não é clara. No Brasil, por exemplo, a intensificação agrícola coincidiu com mais desmatamento.

O uso generalizado de pesticidas também é uma preocupação – entre 1990 e 2015, o uso global de pesticida aumentou mais de 70%. Resíduos de pesticidas podem danificar os ecossistemas terrestres e aquáticos, bem como a nossa saúde. A prevenção de pesticidas sintéticos na agricultura orgânica, e os níveis gerais muito mais baixos de uso de pesticidas em geral, é um fator frequentemente negligenciado nas ACVs. Dos 34 estudos comparando agricultura orgânica com convencional que analisamos, somente nove falam sobre impactos relacionados a pesticidas.

O debate sobre o impacto ambiental da agricultura orgânica tornou-se muito simplista e estreito. Nossa análise, publicada na Nature Sustainability, mostra que a força e benefícios ambientais da agricultura orgânica são frequentemente ignorados por pesquisas atuais, e simplesmente alegar que agricultura orgânica é pior para o meio ambiente é enganoso.

O uso atual de ACVs precisa ser aprimorado e integrado a outras ferramentas de avaliação ambiental. Somente então os consumidores terão uma imagem mais equilibrada.

Christel Cederberg, Chalmers University of Technology, Suécia
Hayo van der Werf, INRAE (Instituto Nacional da Agricultura, Alimentação e Meio-Ambiente da França).

Tradução: Clarisa Carvalho

Os artigos assinados são de responsabilidade dos seus respectivos autores e não refletem necessariamente a opinião da Organis.

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