“Nós respeitamos a sazonalidade. Não trabalhamos esgotando o solo, forçando a produção de alimentos fora da estação. Então precisamos explicar aos nossos membros que não tem como produzir brócolis no verão, por exemplo”

Publicado originalmente no Um Papo Reto

A preocupação dos consumidores com temas relacionados à saúde, sustentabilidade, meio ambiente, ética e transparência nas relações é uma tendência crescente.  Isso faz com que muitos modelos de negócio tenham que se reinventar e abre espaço para novas formas de consumo. Um desses exemplos é o modelo de produção agrícola conhecido como CSA – Comunidade que Sustenta a Agricultura.  

CSA estabelece uma conexão direta entre o agricultor, a produção e o consumidor. Neste modelo são criados grupos em que o cliente não é apenas um consumidor. É considerado um coprodutor, pois paga antecipadamente pelo alimento que vai receber durante o mês. Isso permite que o agricultor planeje melhor a produção, tenha recursos para investir e a certeza da venda. 

Foi este o modelo adotado por Rafael Coimbra quando deixou a carreira como publicitário para se dedicar à produção de alimentos orgânicos na Sta Julieta Bio, fazenda da sua família localizada em Santa Cruz da Conceição, a 200 km da capital paulista.
 
“Eu iniciei plantando o meu alimento. Queria muito aprender e comecei a visitar produtores de orgânicos. Vi que tinha algo muito errado na cadeia de distribuição, porque eu como consumidor pagava muito caro no mercado e os produtores não estavam ganhando. Foi então que comecei a pesquisar modelos de distribuição que fossem diferentes. Descobri a CSA e para mim fez total sentido. É sustentável de verdade e valoriza o produtor, por ser uma relação direta com o consumidor”, conta Rafael. 

No início, ele dividia os alimentos que cultivava com a família e amigos. “Um dia eu tive a certeza de que o que eu queria fazer da vida era dividir com mais e mais pessoas. Principalmente com pessoas que sem o modelo CSA ou outras formas mais baratas de consumo não teriam acesso a alimentos orgânicos”. 

A relação da Sta Julieta Bio com os membros da CSA é de muita transparência e está baseada em um trabalho de educação, para transformar a pessoa de consumidor em coprodutor.    

É necessário entender alguns conceitos e práticas de produção agrícola, como a sazonalidade dos alimentos e os desafios de cultivar, sujeito a intempéries e a possíveis ataques de pragas. “Nós respeitamos a sazonalidade. Não trabalhamos esgotando o solo, forçando a produção de alimentos fora da estação. Então precisamos explicar aos nossos membros que não tem como produzir brócolis no verão, por exemplo”, explica Rafael. 

Para isso, há um trabalho de comunicação feito com os grupos. São informados os períodos de produção dos alimentos, o planejamento das colheitas, sugestão de receitas e dicas para que os clientes aproveitem melhor cada um dos ingredientes que compõem a cesta da semana. 

Antes da pandemia, Rafael promovia um encontro na fazenda com os membros da CSA a cada troca de estação. Era um momento para alinhar expectativas, explicar quais os produtos mais adequados para serem cultivados no período, e uma oportunidade que os clientes coprodutores tinham de colocar a mão na terra, ajudando a plantar.  

Se por um lado a pandemia inviabilizou os encontros, por outro trouxe novos integrantes para os grupos. Consumidores em busca de alimentos frescos, mais saudáveis, saborosos e com menos etapas de comercialização, que fossem direto do campo para a mesa. 

Os membros recebem cestas semanais em que são selecionados os itens de melhor qualidade da semana. Rafael toma o cuidado de não repetir produtos de uma semana para outra, para promover a variedade de alimentos no prato. “Às vezes, o cliente recebe alimentos que não compraria, como frutas nativas da mata atlântica”.
 
Os integrantes recebem antecipadamente a lista dos itens que compõem a cesta da semana e ainda têm a opção de trocar algum item pelo que está disponível na “cesta de trocas”. As cestas de cada um dos grupos são iguais e, mesmo assim, os clientes também trocam itens entre si.  

“É muito legal porque acaba criando relacionamento entre os integrantes de cada grupo, formando uma comunidade em torno do alimento que se organiza para retirar as cestas nos pontos de coleta. Em alguns casos chegam até a virar amigos”, conta Rafael. 

Sta Julieta Bio tem opções de cestas que variam entre R$ 160,00 a R$ 240,00, de acordo com o tamanho. O cliente é responsável por retirar a cesta nos pontos de coleta. Há quatro pontos em São Paulo, um em São Carlos, um em Pirassununga, um em Leme e um em Santa Cruz da Conceição.

Milena Miziara
Agricultora orgânica – Laverani Orgânicos

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