“para potencializar esse diálogo de quem quer comprar, vender ou se tornar parceiro dos orgânicos nessa caminhada, elaborei um pequeno resumo das nove formas básicas de comercialização. E acrescentei algumas observações sobre o que pode ser feito, do ponto de vista do marketing, para torná-las mais efetivas.”

A busca pelos produtos orgânicos só cresce, mas pode crescer muito mais, como dá para concluir pelas respostas do consumidor na Pesquisa Organis, a única voltada exclusivamente ao setor, viabilizada com apoio da Unir Orgânicos e realizada pela Brain Inteligência Estratégica. 

O consumidor existe. Os cativos, os interessados, os curiosos. E chegar a eles, com qualidade, atendendo às suas expectativas, é fundamental para a sustentabilidade do negócio, a melhoria da rentabilidade de todos os envolvidos na cadeia produtiva e a expansão dos valores orgânicos em um mundo cada vez mais preocupado com seu futuro ambiental. Chegar mais perto e com o recado certo, essa é a missão. 

Em minhas palestras pelo Brasil (sim, as pessoas querem cada vez mais saber dos orgânicos) é muito comum que perguntem sobre as principais formas de contato entre os que produzem e aqueles que procuram. Pois todos desejam um mundo mais saudável, justo e sustentável, a começar pelas relações de consumo. 

Outro excelente sinal desse interesse veio em novembro de 2022, com o convite para sermos parceiros da mybest Brazil, uma grande e inovadora plataforma de recomendações de consumo.

Então, para potencializar esse diálogo entre os orgânicos e quem quer comprar, vender ou se tornar parceiro dos orgânicos nessa caminhada, elaborei um pequeno resumo das nove formas básicas de comercialização. E acrescentei algumas observações sobre o que pode ser feito, do ponto de vista do marketing, para torná-las mais efetivas.  

Boa leitura. E não esqueça que isso é uma conversa e o espaço está aberto às suas ideias. Sinta-se à vontade para interagir pelo endereço logo abaixo da matéria. 

1 – Feiras orgânicas e agroecológicas 
Existem milhares de feiras orgânicas com calendário fixo no Brasil, a maioria delas organizadas pelas prefeituras. Inclusive, estreamos nossas recomendações na mybest Brazil destacando algumas feirinhas municipais de Curitiba. Quer ver? É só clicar aqui.

Mas, vamos ao Brasil e o Brasil é grande. Contando apenas as feiras que se cadastraram no IDEC – Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor, são 885.. Mas sabemos que esse número não retrata a realidade, afinal, temos 5.570 municípios e muitos deles com mais de uma feira ativa.

Então, para começar, um dever de casa: entre no site da entidade feirasorganicas.org.br, clique em Adicionar Local e inscreva lá sua feira orgânica, seja você frequentador, feirante ou administrador público. É interessante essa atualização, para mostrar a realidade numérica e, também, entrar no mapa disponibilizado pelo IDEC, que facilita a vida dos muitos consumidores que o consultam. 

As chamadas “feirinhas” são os mais tradicionais pontos de contato, mas tradição não deve rimar com inação. Para não dizer que estamos parados no tempo, algumas delas já apresentam novidades, indo além dos óbvios – e fundamentais – verduras, frutas, legumes, grãos e ovos. Já fazem sucesso e formam filas os espaços com carnes orgânicas, derivados de leite, produtos industrializados. E dão sinais de vida, finalmente, os itens não-alimentícios, como roupas e acessórios, cosméticos, decoração, flores, ervas medicinais, artigos para pets.  

Esse aumento de variedade, com certeza, pode potencializar o clima dinâmico e atrair ainda mais gente, o que, no fim das contas, significa incrementar a venda dos produtos frescos e in natura. Indústrias do setor podem aproveitar as feirinhas, inclusive, para promover degustações e fazer seus lançamentos. 

Outra coisa importante. Feira é, para muitos, não apenas utilitária, mas um passeio. Que tal incrementar o ambiente com apresentações artísticas (as prefeituras geralmente têm órgãos culturais que podem ajudar), espaços para as crianças, atrações para adolescentes? Ou reservar uma banquinha para ajudar a associação de moradores dos bairros vizinhos a manter contato com o povo? Ou caprichar nas opções de lanches e bebidas? São apenas algumas ideias entre muitas que podem tornar a tão querida feirinha um ponto de encontro ainda mais atrativo, ampliar o contato com as pessoas e aumentar o movimento. Qual é a sua? 

2 – Compras governamentais  
O Brasil, ainda que timidamente, já conta com alguns programas de compra direta de produtos orgânicos para destinar a escolas, hospitais, beneficiários de ações sociais, entre outros.  

Claro que, em se tratando de órgãos oficiais, eles têm sua burocracia, mas vale a pena investir tempo para conhecer as regras e participar. É venda garantida, por preços razoáveis, sem risco de inadimplência e com algum espaço para negociação em termos de produtos, prazos, quantidades.  

E se os órgãos públicos da sua cidade ainda não oferecem esses programas ao cidadão, que tal reunir os interessados e levar reivindicação a secretarias, parlamentares etc.? Inclusive, porque existe o Programa Nacional de Alimentação Escolar (Pnae), regulamentado pela lei 11947, que determina que 30% dos recursos repassados aos estados e municípios para merenda escolar sejam obrigatoriamente aplicados na aquisição de alimentos orgânicos e da agricultura familiar. As regras permitem, inclusive, um acréscimo de até 30% no valor de venda, caso os produtores sejam certificados. Além disso, existem, ainda, os programas de estados e municípios, com suas próprias verbas, aliás, quase sempre bem superiores às federais. 

Então, para começo de conversa, é preciso ficar atento e fazer cumprir as leis que beneficiam aos produtores orgânicos, direitos que, como você pode imaginar, foram duramente conquistados pela sociedade. 

3 – Distribuidores 
Fazer a distribuição dos produtos orgânicos por uma empresa especializada é uma forma eficaz de conseguir que eles cheguem a muitos pontos de venda. Mas ela só é vantajosa se o produtor rural souber negociar bem antes de assumir o compromisso e se o distribuidor aceitar as peculiaridades orgânicas.  

E vice-versa: os distribuidores, quase sempre, querem tudo dentro de uma determinada rotina, para então planejarem sua logística e garantirem o envio regular ao varejo. E isso implica em exigências relativas a quantidade, qualidade e prazos.  

Neste caso, vale ao produtor rural o esforço de mostrar a seu possível parceiro distribuidor que um dos diferenciais dos orgânicos está justamente em não forçar a natureza. Com um pouco de boa vontade, não será muito difícil para os dois lados estabelecerem, juntos, um calendário realista, que leve em conta o clima e priorize a produtos locais cultivados na época correta. 

4 – Cesteiros 
Essa forma de comercialização de orgânicos, com entrega domiciliar de uma cesta de produtos direto do campo, em datas estabelecidas, cresceu exponencialmente no isolamento social da pandemia. Cabe agora aos produtores administrarem bem esse grande patrimônio que é o contato direto com seus clientes finais. É possível, sim, e desejável, continuar e ampliar essa forma de distribuição, pois continua sendo uma excelente iniciativa, pelas comodidades que oferece ao consumidor, mesmo com a liberação do comércio presencial. Para o produtor, isso significa recursos fixos garantidos, que facilitam seu planejamento financeiro.  

Para prosseguir nesse tipo de relacionamento é sempre bom ouvir o consumidor e fazer de tudo para manter a preferência. Apenas como exemplo, adequando ao máximo o conteúdo da cesta ao gosto e necessidades do cliente. Enfim, aproveitar o diálogo aberto para aprimorar e ampliar esse tipo de venda orgânica. 

5 – Restaurantes 
Cresce no Brasil o número de locais que servem refeições orgânicas prontas, para entrega ou consumo no local. Eles são excelentes opções para quem deseja comer bem e bons clientes dos produtores orgânicos.   

Nesse caso, vale também o equilíbrio na relação entre todos os envolvidos, para que os negócios sejam sustentáveis nos dois lados do balcão.  

Por exemplo, os restaurantes podem se programar para a oferta de alimentos da estação em seus cardápios e se beneficiarem dos preços menores.  

Por seu lado, nada impede o agricultor de sugerir que as cozinhas dos restaurantes criem seus pratos conforme a realidade da produção.  

O importante é chegar a uma dieta parceira, capaz de alimentar corretamente o lado financeiro de ambos, sem necessidade de altas repentinas de preços ou falta de produtos que, no final da linha, podem desagradar sua majestade, o consumidor. 

Um grande passo do mercado, já colocado em prática com sucesso, é o fornecimento de refeições orgânicas pelas empresas em seus refeitórios. 

Trata-se de uma ação relativamente simples, mas com grande impacto em termos de valorização das marcas, por demonstrar real preocupação com a saúde dos colaboradores e a sustentabilidade ambiental.  

Se você é um produtor, pode reunir um grupo capaz de garantir esse fornecimento e se antecipar, apresentando um plano nesse sentido aos gestores de corporações, especialmente os ligados ao RH e detalhar as muitas vantagens da iniciativa, inclusive os benefícios em termos de imagem.  

6 – Clube de compras 
É uma modalidade em constante construção, que se caracteriza, no fundo, por diversas formas de cooperativismo que têm como objetivo realizar entregas programadas de produtos, com benefícios para todos os envolvidos.  

Pode ser inciativa de produtores, que unem forças para atender grandes clientes ou certo número de consumidores individuais. Em algumas modalidades, os compradores tornam-se, de certa maneira, sócios dos produtores em determinadas demandas. Planta-se sob medida. 

Pode, também, ser implantado por iniciativa de compradores, para reduzir custos e garantir insumos. Por exemplo, restaurantes.  

Outra forma de relação, ainda mais direta, é a CSA (Comunidade que Sustenta a Agricultura). Ela funciona como uma sociedade entre consumidores, que se dispõem a pagar um determinado valor mensal, e um grupo de produtores, que se compromete a entregar os produtos orgânicos por período estipulado – por exemplo, um ano.  

Nesse tipo de arranjo, o agricultor ganha a tranquilidade de ter sob controle suas finanças de curto e médio prazos e quem consome tem a garantia de produtos de alta qualidade em sua mesa, além do direito de verificar o processo com seus próprios olhos, a qualquer momento, por meio de visitas pessoais aos locais de produção. 

7 – Indústria 
Os orgânicos ainda são vistos pela maioria dos consumidores, conforme a pesquisa nacional Organis, como produtores de frutas, legumes e verduras. Mas cresce a procura – que deve ser muito bem trabalhada pela comunicação do setor – de produtos industrializados sustentáveis e, com ela, a oferta cada vez maior desses itens nos pontos de venda.  

Essa demanda é, em parte, atendida pelo cada vez mais diversificado e inovador setor industrial orgânico. Entretanto, a maior fatia desse mercado ainda está nas mãos de divisões especializadas dentro das indústrias convencionais, interessadíssimas no poderoso market share orgânico (leia mais sobre ele clicando aqui) da saúde e do meio ambiente.  

Essa constatação nos leva a duas variantes. A primeira delas é que há muito espaço para o crescimento das empresas orgânica de raiz, desde que se organizem em conjunto para enfrentar os gigantes das prateleiras. E a outra se revela como enorme oportunidade, já que a grande indústria precisa de grande quantidade de insumos orgânicos certificados para fabricar seus produtos de forma adequada à Lei que rege o setor. Para se dizerem orgânicos, os produtos devem ter determinadas proporções de ingredientes, puros, naturais e… composto de, no mínimo, 95% de orgânicos certificados.  

Essa necessidade mercadológica industrial vem gerando uma poderosa cadeia. Muitos produtores já se tornam pequenas (e até grandes) agroindústrias especializadas em produzir e fornecer insumos orgânicos processados, semiprocessados ou concentrados, aumentando assim a sua margem de lucros em relação ao fornecimento de produtos in natura. Outras empresas se especializaram em comprar a matéria-prima orgânica para transformá-la em ingredientes para outras indústrias. 

E esses mesmos raciocínios também são válidos para a exportação desses insumos industriais orgânicos, outro mercado atraente e no qual já brilham alguns empreendedores brasileiros, de forma individual ou associados em redes de produtores associados.  

Cabe a todos os atores, em especial os diretamente ligados à produção, manter vigilância sobre esse processo de popularização das linhas orgânicas de grandes empresas, para que a famosa lei dos orgânicos, que protege a nós e ao consumidor, seja rigorosamente cumprida.  

8 – Varejo 
Aqui cabe falar de “varejos” pois são muitos. Primeiro, é claro, as fiéis e tradicionais lojas de produtos naturais, com as quais os orgânicos já têm um relacionamento próximo. Algumas vezes, ainda falta uma melhor sinalização para os produtos orgânicos nesses espaços, mas que os vendedores buscam compensar no atendimento pessoal.  

Pesquisas revelam que os supermercados são a forma mais popular de se comprar orgânicos, portanto, investir no relacionamento com eles é ótimo negócio.  

Com os de lojas únicas e pequenas redes locais, ainda é possível se trabalhar de forma mais pessoal. Entretanto, na relação com as grandes redes isso é inviável. Nesse caso, é necessário lidar com seus centros de distribuição. E, como já dissemos em outros itens, negociar com grande franqueza evita futuras dores de cabeça para ambos, comprador e vendedor. Outra opção é fechar contrato com distribuidores especializados, com os devidos cuidados, como já vimos no item 3, acima.  

Uma boa ideia para os orgânicos é interagir com os varejistas naquilo que eles mais gostam: valorização de seus pontos de venda. Isso pode ser feito com feirinhas orgânicas em determinados dias, degustações, promoções, lançamentos, campanhas, gôndolas e quiosques especiais. Vai da criatividade, poder de convencimento – e disposição para realizar o combinado – o sucesso desses mini eventos promocionais. Mas certamente são capazes de encantar os clientes e conquistar o coração dos varejistas e suas gerências. Quem faz junto, não esquece. 

Outra coisa importantíssima é insistir com os varejistas que os orgânicos não se resumem apenas a produtos in natura e que podemos abastecer uma ampla variedade de setores das lojas com nossos industrializados. Um processo educativo que começa, cresce e se mantém na comunicação. 

9 – Exportação 
Atualmente, só existe uma forma de se exportar produtos orgânicos, a certificação por auditoria, com exceção do Chile, que é o único país em que o Brasil mantém acordo de equivalência e, portanto, aceita também a certificação no sistema participativo. Então, providencie a documentação legal se você quer atuar em outros mercados do mundo, que aliás, movimentam muitos bilhões de dólares, crescem solidamente e costumam ser receptivos a produtos brasileiros. 

Mas, como quase tudo na vida e nos negócios, tudo tem seu outro lado e a reciprocidade é uma lei, ou, resumindo: importar também é importante. Inclusive por criar vínculos próximos de relacionamento com empresas especializadas no comércio internacional.  

Outro bom motivo para importar é que existem excelentes produtos, inovadores, que ainda não tem similares brasileiros. A chegada deles é estímulo para a indústria nacional se modernizar e atender aos nichos de consumidores abertos pelos produtos estrangeiros. 

Cobi Cruz
Diretor Executivo da Organis – Associação de Promoção dos Orgânicos

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