“Esse meu novo aprendizado esbarrou, um dia, numa questão que me deteve e que fiquei remoendo: Por que o Brasil, maior produtor mundial de café, não está nem entre os 10 principais produtores de café orgânico do mundo?”

Prazer! Sou o Gustavo Mamão! O sobrenome não necessariamente tem a ver com esta coluna, mas permitiu colecionar histórias desde minha infância. Já como adulto estudei o mundo dos negócios, me embrenhei pelo universo do empreendedorismo e inovação (inovação de forma sistemática, até porque este conceito é pra lá de amplo), mas minha grande paixão são os negócios com propósito. Minha tese de mestrado foi sobre “como empresas que querem mudar o mundo conseguem estruturar seu crescimento sem perder seu propósito?”, ou seja, como criar impacto positivo em larga escala, usando o modelo “negócio” como motor de transformações.

Morando atualmente na região de Boston, nos Estados Unidos, fui tão afetado quanto todos vocês sobre aquilo que acreditava ser o futuro. Graças à Deus, a minha saúde e da minha família vão bem, mas a sensação foi a de ver um raio cair bem pertinho. Grandes cidades como Nova York, ou mesmo Boston, colapsaram. Tudo isso me fez refletir muito sobre a descontinuidade da vida moderna. Com alguma reserva financeira e trabalhando no formato home-office, sou parte dos privilegiados que não teve que se arriscar na linha de frente, como os profissionais de saúde e de serviços essenciais, os verdadeiros heróis deste novo mundo.

Nestes momentos de reflexão, perguntas como “o que é essencial para mim?” tiveram suas respostas mais claras. De uma visão ainda do final de 2019, resolvi intensificar uma iniciativa que fundei há alguns anos, a Flourish [Negócios com Propósito], e direcioná-la para o tema da agricultura orgânica no Brasil. Mas o que alguém vindo do mundo dos negócios, morando fora do Brasil, teria para falar sobre produção de alimentos orgânicos? Eu tenho a sensação de que é essa é uma daquelas grandes oportunidades que um país como o nosso não pode deixa passar. 

Quando brindávamos a chegada de 2020 o mundo já era outro, mesmo antes da pandemia. Eu assistia de longe o Brasil leiloar reservas de petróleo do pré-sal enquanto só se falava nos investimentos em energias renováveis e em carros elétricos – o resultado foi um ágil de venda ridículo. Enquanto, grosso modo, 50% do agronegócio brasileiro se sustenta da soja e 2/3 dessa produção alimenta animais, o mundo já está em busca de alternativas de proteínas “plant-based” (baseado em plantas). Não precisamos falar do contrassenso de desmatar florestas para criar gado, uma vez que a pecuária e o consumo de carne bovina são reconhecidos entre os principais causadores das mudanças climáticas. As novas gerações já entenderam isso e de alguma forma vão reforçar o declínio desta cadeia de produção ao longo das próximas décadas (1/4 dos norte-americanos entre 25 e 34 anos já se declaram veganos ou vegetarianos). 

Mas talvez ainda me falte muita compreensão sobre a “sociologia do campo”! Minhas principais experiências são, sobretudo, duas. A primeira como empreendedor e executivo de uma empresa de controle biológico nascida na Universidade Federal de Viçosa. Para não me alongar muito, escrevi um livro para processar os aprendizados dessa experiência (Inovação na Raiz – uma jornada empreendedora a partir da universidade brasileira). Desta primeira jornada ficou a impressão de como tudo o que é bom para o meio ambiente e que impacta também a saúde do trabalhador do campo têm pouco valor para maior parte dos produtores. O que vale, quase que exclusivamente, é a produtividade da lavoura em um horizonte máximo de um ano! 

A minha segunda grande exposição, trabalhando como co-empreendedor de uma marca de café que valoriza o trabalho de pequenos produtores, foi conhecer cooperativas de café no Brasil que adotaram o modelo de produção orgânica. Para mim, foi fascinante conhecer histórias como a da Coopfam e a da Cooperativa dos Costas. Histórias que nascem com um grau de consciência elevado sobre as multidimensões da produção de um alimento. Esse meu novo aprendizado esbarrou, um dia, numa questão que me deteve e que fiquei remoendo: “por que o Brasil, maior produtor mundial de café, não está nem entre os 10 principais produtores de café orgânico do mundo”? E olhando para meu estado, Minas Gerais, que se fosse um país, seria o segundo maior produtor de café do mundo, me perguntei “por que conseguimos contar nos dedos das mãos as cooperativas de pequenos produtores que incentivam o modelo de produção orgânica?”.

A esta altura, notem que tenho mais questões do que respostas. Daí ter decidido tratar o tema agricultura orgânica no Brasil como uma jornada de aprendizado. Para cada uma dessas questões pretendo continuar buscando respostas e conhecer pessoas e iniciativas que já dedicam suas vidas a este tema, porque certamente também são apaixonados pela convivência harmoniosa do homem com a natureza e tem a compreensão da importância de uma saúde plena para todos os seres humanos. 

Para me acompanhar nessa jornada, visite o site da Flourish e se inscreva para acompanhar nossos textos de aprendizados e webinars de discussão. Já no primeiro webinar, que abordará o atual momento de consumo de orgânicos, no dia 23/06, às 16h, teremos a honra de contar com a participação do Clauber Cobi Cruz, diretor da Organis, de empreendedores da Orgânicos in Box, do Rio de Janeiro, e de um especialista em certificações e selos de origem.

Gustavo Mamão
Fundador Flourish
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