“O frango orgânico leva meses para ficar pronto, toma sol e não toma antibióticos. Os orgânicos não torturam os animais, querem animais naturalmente saudáveis.”

Alguns preferem falar do valor dos produtos orgânicos, em vez de falar do preço. Mas, na prática, os consumidores se importam, e muito, com o preço, e temos de enfrentar essa questão.

Há vários motivos para o orgânico ser mais caro que o convencional. Um deles é a baixa escala de produção: quanto maior a quantidade produzida, menor o custo unitário. Isto é matemático. Para ter lucro, o produto – seja orgânico ou convencional – tem que apresentar margem de contribuição (receita líquida menos custos variáveis) que pague os custos variáveis, os custos fixos, as despesas (de administração, de vendas, financeiras e outras), e ainda garanta lucro para o agricultor.

Tenho trabalhado em propriedades rurais, levantando os custos de produção de agricultores orgânicos, e vejo que a grande maioria dos produtos apresenta boa margem de contribuição. Mas a quantidade vendida não tem sido suficiente para cobrir custos fixos e despesas, e ainda sobrar algum dinheiro para reinvestir na produção e viver dignamente.

Então, por que não se produz e se vende maior quantidade de orgânicos?

Há também vários motivos. A demanda, embora esteja crescendo, ainda é pequena. A baixa renda da maioria da população brasileira leva o consumidor a comparar preços, e aí se cria um círculo vicioso para o produto orgânico: preço desestimulante, poucas compras, pouca produção, preço unitário maior, e o círculo se fecha.

A grande maioria dos produtores orgânicos trabalha em pequenas áreas, tem conhecimento rudimentar de administração e finanças, pequena capacidade gerencial, não possui reserva financeira significativa e não gosta de se aventurar em crédito bancário. A conjunção desses fatores, e ainda uma certa propensão a não buscar mais riqueza material do que já tem (isto daria assunto para um livro de sociologia), leva o pequeno produtor a se satisfazer com a sua produção e o seu modo de vida. Talvez isso tenha uma certa dose de sabedoria.

O desconecimento do consumidor do que é o produo orgânico e das suas qualidades é outro motivo limitante da venda.

Acredito que a combinação dos três fatores – preço alto, desconhecimento do consumidor e características do produtor – é o que limita a produção e as vendas.

Mas vejamos o outro lado da moeda.

Produto bom e de boa qualidade costuma ser mais caro. A população deveria ser amplamente informada de que o produtor orgânico cuida do solo, da água, da saúde dos consumidores e dos trabalhadores, da biodiversidade, do ambiente em geral, do planeta, enfim, e isso gera custos que o produto convencional não tem. Além disso, o orgânico tem custos de certificação. Mais tarde, a sociedade pagará a diferença, na forma de despoluição, tratamento de doenças, desassoreamento de rios e lagos, recuperação de solos erodidos, recomposição da fauna e da flora. Se acrescentarmos as contas sociais e ambientais, o produto orgânico talvez tenha o mesmo preço do convencional. Mas não há trabalhos, no Brasil e no exterior, que façam essas contas.

A produtividade depende de tecnologia, e esta depende da pesquisa. A produtividade dos orgânicos pode e deve aumentar, fazendo os preços diminuírem, se houver pesquisa e avanços na tecnologia, mas há pouca pesquisa sobre orgânicos nos órgãos públicos e nas universidades. A pesquisa é dirigida majoritariamente aos produtos convencionais.

Mas, em certos casos, a produtividade dos orgânicos deve continuar menor. A vaca criada convencionalmente tem alta produção de leite, pode chegar a 60 quilos em um dia, mas recebe uma parafernália de produtos químicos e de técnicas artificiais de criação. Muitas são confinadas pelo resto da vida e não veem o sol. Outro exemplo é o frango. O convencional recebe antibióticos para “limpar” os seus intestinos, e assim absorver rápida e totalmente toda a ração e ficar pronto em 40 dias. O frango orgânico leva meses para ficar pronto, mas toma sol e não toma antibióticos. Os orgânicos não torturam os animais, não fazem criações em gaiolas, querem animais naturalmente saudáveis.

Vegetais orgânicos, muitas vezes, também têm produtividade menor que a dos convencionais. Entretanto, sucessivas análises da Anvisa mostram contaminações acima do permitido ou com produtos proibidos, em alface, banana, pimentão e cenoura convencionais, e nem precisamos falar do morango.

Menor produtividade aumenta o custo unitário do produto. Mas não queremos produtividade a qualquer custo. Queremos saúde para as pessoas, plantas, animais e para o planeta.

Queremos também consumidores ativos e participantes. Precisamos de uma associação de consumidores orgânicos, que não existe no Brasil, que ajude a fiscalizar e a deslanchar o mercado.

Por fim, não podemos nos conformar e nos acostumar com grandes diferenças de preço, que muitas vezes encobrem ineficiências na produção e na comercialização dos orgânicos.

J. P. Santiago
Engenheiro Agrônomo, consultor técnico e financeiro em Agricultura Orgânica.
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