“Precisamos divulgar cada vez mais os verdadeiros sentidos da sustentabilidade e espalhar que, de maneira alguma, ela significa voltarmos às cavernas ou morarmos em cabanas de folhas no meio do mato.”

O movimento orgânico está tão firmemente enraizado na sustentabilidade que, às vezes, corremos o perigo de superestimar a compreensão da maioria das pessoas sobre esse conceito.

Esses dias, li matéria a respeito de uma imensa indústria de compensados, sediada na Amazônia que, lá pelas tantas, se declarava ecologicamente sustentável por praticar o reflorestamento em larga escala. Curioso, fui pesquisar no site da empresa e verifiquei que, realmente, ela cultivava com muito orgulho milhões de árvores australianas (eucaliptos, para ser exato), dispostas em fila indiana em local que originalmente abrigava um bioma amazônico. Na verdade, era um gigantesco depósito de matéria-prima a céu aberto, de onde a madeira era tirada para – literalmente – virar pó e, depois, “sustentar” a produção de placas de MDF.

Usei esse exemplo, entre muitos, não para expor a organização (por isso, aliás, não cito o seu nome) mas apenas para ilustrar duas constatações. A primeira delas é que as empresas são cada vez mais cobradas em relação aos cuidados com o meio ambiente e, por isso, sentem necessidade, inclusive mercadológica, de dar explicações públicas à sociedade, ainda que, muitas vezes, de forma equivocada. A segunda é que “sustentabilidade” vem se tornando uma espécie de palavra curinga, desconectada do contexto ecológico em que ela ganhou seu significado.

Então, que o movimento orgânico não economize na hora de divulgar seus valores. As pessoas, as mesmas que podem pressionar empresas e governos (e, inclusive, ocupar cargos nessas estruturas), precisam saber que “sustentável” é o ciclo da vida. E que nossa sobrevivência depende inteiramente desse delicado equilíbrio de forças, dessa grande rede que interliga todos os organismos do planeta. Constatação irrefutável da ciência, o conceito de ação/reação deveria ser ensinado a todos desde a primeira infância, fortalecendo o sentido de responsabilidade perante nós mesmos e às coletividades, incluindo aí as de não humanos.

Muitos, simulando profundidade e fingindo preocupação com o semelhante, dizem que não é possível oferecer uma qualidade de vida aceitável a todos sem avançar mais e mais sobre as reservas naturais. Com isso, sugerem, nas entrelinhas, que a sustentabilidade tem algo de elitista, de privilégio para poucos. Essa proposital confusão nasce errada já na base, supondo que as únicas maneiras da humanidade progredir são entronando a cobiça, a ganância, o egoísmo, o consumo inconsciente e o desprezo pelas futuras gerações.

Por essas e muitas outras excelentes razões precisamos divulgar cada vez mais os verdadeiros sentidos da sustentabilidade e espalhar que, de maneira alguma, ela significa voltarmos às cavernas ou morarmos em cabanas de folhas no meio do mato. Pelo contrário, sustentável é a mais extrema modernidade, a mais avançada visão de futuro, aquela que joga pela vitória da vida.

Hoje, a tecnologia nos permite dar novos passos no rumo de uma produção que não seja inimiga da humanidade. Integrados por ela, podemos valorizar as comunidades locais, unidas por laços de história, cultura e afeto. Em lugar do vale tudo que torna os gigantes ainda mais perigosos, podemos estabelecer a cooperação, que potencializa o uso de recursos e reduz desperdícios. Em vez de dependermos de estruturas desumanizantes, podemos nos conectar uns aos outros para garantir melhor distribuição da qualidade de vida. Podemos, essa é a palavra. Uma palavra que deve ser entendida de forma sustentável.

Cobi Cruz
Diretor na Organis – Associação de Promoção dos Orgânicos

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