“Uma das razões para o preço alto do alimento orgânico passa pela falta de uma política pública, agressiva (no bom sentido), que incentive a agricultura de base agroecológica, incluindo aí a questão do crédito e do financiamento (que acabam sendo uma política pública).”

Depois de ler o meu último artigo (“Orgânicos sim; por que não?”) publicado aqui, amigo meu me mandou um zap: “o que não dá para entender é por que os preços ainda são mais caros”.

Em vez de explicar, eu poderia, simplesmente, apenas enviar para ele o artigo “Por que os produtos orgânicos são mais caros?”, de J.P. Santiago, publicado aqui neste espaço. Inclusive, já o fiz.

Mas vamos tentar ir além. Resumindo à expressão mais simples, vamos ver que, no fundo, tudo é uma questão de escala; a produção é menor, os custos de produção são maiores, a demanda é relativamente grande em relação à oferta e vai por aí… Tudo isso faz com que o preço final seja mais caro do que o produto, digamos, assim, convencional.

Realmente, o preço mais alto que o preço do alimento produzido com a utilização de fertilizantes sintéticos e agrotóxicos ainda é um fator que impede a compra e o consequente aumento da produção do alimento orgânico. Esse dado, inclusive, está na última pesquisa divulgada pela Organis: o preço dos produtos continua a ser um impeditivo para um crescimento maior do mercado (que foi de 20% de 2017 para 2019), já que 65% dos entrevistados apontaram o preço como o principal motivo pelo qual não consomem orgânicos em maior quantidade.

O campo, porém, é fértil. Ainda segundo a pesquisa, 67% dos entrevistados estão dispostos (42%) ou muito dispostos (25%) a aumentar o consumo. Acrescente-se a isso o fato de que 88% têm interesse em busca de informações sobre como manter uma alimentação mais saudável. E mais: 88% dos compradores e 67% dos que não são compradores estão dispostos a aumentar ou começar o consumo de orgânicos.

Mas o que deve ser feito para baratear o preço do produto orgânico? A resposta é simples e, ao mesmo tempo, complicada. E se resume no seguinte: política pública.

Uma das razões para o preço alto do alimento orgânico passa pela falta de uma política pública, agressiva (no bom sentido), que incentive a agricultura de base agroecológica, incluindo aí a questão do crédito e do financiamento (que acabam sendo uma política pública).

Basicamente, quem produz a maioria do alimento de base agroecológica é o pequeno produtor, a agricultura familiar. Mas para aumentar sua produção e, com isso, conseguir um preço final mais barato, ele precisa, fundamentalmente, de espaço (mais terra) e investimentos em técnicas agrícolas, equipamentos e pessoal, por exemplo.

Embora a agricultura familiar seja o principal fornecedor de alimentos in natura que o brasileiro come – estima-se em 70% -, na escala ele acaba perdendo feio para o chamado agronegócio. Para se ter uma ideia, preste atenção nestes números: de acordo com o último Censo Agropecuário Brasileiro (2017) o pequeno produtor ocupa uma área de correspondente a 23% de todos os estabelecimentos agropecuários do país. Os outros 77% estão nas mãos do que chamamos de agronegócio, a produção em alta escala de produtos alimentares considerados commodities, exportáveis, como a soja, o milho, a laranja, o café, o açúcar.

O lógico seria, portanto, que a agricultura familiar tivesse mais incentivo e crédito disponível. Mais crédito significa poder aumentar a produção e praticar preços mais baixos, por exemplo.

E não é preciso inventar a roda. Bastaria ao Governo Federal dar mais atenção, incentivar e liberar mais verbas para dois programas já existentes: o Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) e a Planapo (Política Nacional de Agroecologia e Produção Orgânica).

O complicado é que, quando se fala em apoio e incentivo à agropecuária, fala-se, principalmente, do agronegócio, que tem, por exemplo, uma poderosa bancada parlamentar, conhecida como Frente Parlamentar da Agropecuária.

Nada contra apoiar e incentivar o grande produtor agropecuário, mas não em detrimento da agricultura familiar, que é, por exemplo, a principal geradora de empregos no campo.

A agricultura familiar é a base da economia de 90% dos municípios brasileiros com até 20 mil habitantes. Ressalte-se que, segundo o IBGE, 68% dos municípios brasileiros têm até 20 mil habitantes. Além disso, é responsável pela renda de 40% da população economicamente ativa do país. 

E o tamanho da agricultura familiar no Brasil não é pouca coisa não. Ainda de acordo com o Censo Agropecuário, 73% das pessoas que trabalham na produção agropecuária têm parentesco com o produtor. 

Um levantamento feito pelo portal Governo do Brasil em julho do ano passado mostra que, caso o país tivesse só a produção familiar, seria o 8º maior produtor de alimentos do mundo, com um faturamento anual de US$ 55,2 bilhões. Quando se soma a agricultura familiar com toda a produção agropecuária, o Brasil passa de oitavo maior para a quinta posição.

Produção orgânica e agricultura familiar têm tudo a ver.

Chico Junior
Jornalista, escritor, autor dos livros “Roteiros do Sabor Brasileiro”, “Roteiros do Sabor do Estado do Rio de Janeiro” e “Na boca do estômago – Uma viagem ao prazer de cozinhar e comer”
Os artigos assinados são de responsabilidade dos seus respectivos autores e não refletem necessariamente a opinião da Organis.

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